Crédito: http://josevianafilho.blogspot.com
por Antonio Falcão
Como um rei espartano / Romário, não, tem outro itinerário /
é Lima Barreto falando javanês / esse extraordinário cigano.
Romário é de repente. Sempre foi. Desde que nasceu em 29 de janeiro de 1966, no Rio. Seu Edevair, o pai, pensou que não sobrevivesse. Porém, ele cresceu saudável na favela do Jacarezinho, onde aos três anos já chutava bola. E foi se aprimorando até que o pai criou o Estrelinha, time no qual Romário foi visto em 79 por uns vascaínos. À época, a família dele já morava na Vila da Penha e, ansioso, o jovem foi fazer teste em São Januário. Mas voltou logo, pois, por conta do tamanho, um técnico o rejeitara, dizendo-lhe que só servia para lavar capô de fusca. Então, desolado, o filho de Edevair foi brilhar no infanto-juvenil do Olaria carioca.
De repente, em 80, Romário voltou ao Vasco e foi aceito. Lá, engoliu a bola e foi para o escrete brasileiro de juniores em 1985, quando se profissionalizou. Antes de ser bicampeão estadual em 87/88 e no torneio espanhol Ramón de Carranza pelo clube, ele estreou na equipe principal do Brasil em 23 de maio de 87 e, ano seguinte, foi às Olimpíadas de Seul ser vice-campeão, assim como ganhar no escrete as taças do bicentenário australiano e do Torneio do Povo. Isso serviu para Romário ser vendido ao holandês PSV Eindhoven. Antes de ir para a Europa, ele casou com Mônica, em quem faria dois filhos. No time de Eindhoven, foi tricampeão nacional e venceu 2 Copas da Holanda. Pela seleção, venceu no Rio a Copa América de 89. E, ano seguinte, mesmo com o perônio esquerdo complicado, Romário esteve no Mundial da Itália para disputar apenas o primeiro tempo da partida contra a Escócia.
Ele ficaria no PSV até meados de 1993, quando foi para o Barcelona. Nesse ano, fez as eliminatórias pelo Brasil e se sagrou campeão da Liga espanhola. Em 94, além de bisar o título pelo Barça, sagrar-se-ia campeão mundial, tendo sido ainda escolhido pela Fifa o melhor jogador dessa Copa.
Em todos esses tempos e clubes a marca de Romário foi a inigualável artilharia. Porém, em 95, antes de jogar no Flamengo carioca, o ídolo desfez seu casamento e se encrencou com cartolas e técnicos, que (segundo ele) só o convocaram, para salvar a Pátria em 1993 e 94, a pedido do presidente da CBF.
No Rio, depois de curtir muita noitada na Europa, o Baixinho (como é chamado) deu trabalho à boemia. Mas em campo jamais repercutiu nele esse tipo de vida, a ojeriza a treinamento físico, concentração... Até porque, atuando, Romário quase não corria, podendo de repente explodir, sobretudo se estivesse no seu habitat, a grande área. Todavia, próximo de completar 30 anos, nele aflorou um estrelismo que o fazia discriminar, até, aos colegas de profissão nos clubes e no escrete brasileiro. Depois, a sua postura na imprensa passou a ser imperial e, aos poucos, o Baixinho ia se afastando ou sendo afastado da seleção brasileira.
Em 1996, após ter feito o campeonato estadual pelo Flamengo, Romário se transferiu para o Valência espanhol, clube no qual teve uma passagem meteórica. Sem ambiente na Espanha, ele voltaria por empréstimo ao Flamengo para ser campeão carioca de 97. E, depois, retorna ao Valência contundido, sem ânimo e fora de forma. À época, recém-casara com Daniele, que lhe daria um filho - o terceiro da grife Romário de Souza Faria. Mas, de repente, ainda em 97, de novo na Gávea, ele foi o artilheiro no Rio. E pelo Brasil seria vencedor do Torneio da França, da Copa América, na Bolívia, e da Copa das Confederações, na Arábia Saudita.
A presença de Romário na seleção que foi à Copa de 1998 mexeu com a expectativa geral. Esperava-se que com Ronaldo ele formasse a dupla de área imbatível. Só que o Baixinho era malvisto na comissão técnica. Mas, na qualidade de o maior homem de área do mundo, Zagallo teve que engoli-lo. No entanto, a inflamada panturrilha direita do filho de seu Edevair ficaria do lado do treinador e, por isso, o craque foi cortado.
À distância, frustrado, Romário viu o Mundial e, a serviço de uma emissora de televisão, fez comentários isentos. No jogo contra o Marrocos, ele resumiu a entrada de Edmundo no lugar de Bebeto: "Entrou quem devia, saiu quem não devia". O povo entendeu a simplicidade. E concordou. Finda a emoção da Copa, nesse mesmo 98, o Baixinho em cinco jogos pelo Flamengo foi o artilheiro carioca (15 gols). Ano seguinte, bisou a artilharia (16), fez o Fla campeão do Rio, foi goleador da Copa Mercosul (8) e o Chuteira de Ouro da revista Placar. Mas, de repente, em 2000 voltou ao Vasco, onde não só repetiu a artilharia do campeonato carioca (19) e da Copa Mercosul (11), como foi goleador do torneio Rio-São Paulo (12), campeão do Brasil, escolhido de novo o Chuteira de Ouro, o melhor craque das Américas (para um jornal uruguaio) e superou Roberto Dinamite - 62 gols, em 81 - na artilharia vascaína com 67 tentos. A seguir, Romário venceu a Taça Rio, foi goleador do Campeonato Brasileiro (21) e bisou o título de melhor das Américas.
Entre a Copa da França e 2002, Romário foi para o escrete só 4 vezes: uma, em 99, com o técnico Luxemburgo, outra com Émerson Leão e duas com Scolari. Este, o queria na Copa América de 2001, mas o Baixinho descartou, o que irritara o técnico. Diz-se, até, que esse incidente foi o carro-chefe da não ida dele à Copa do Mundo na Ásia. Será?
Seja como for, Romário já deu prova que foi dos craques mais geniais da história. Mas, infelizmente, no afã de ser convocado aos 36 anos para um Mundial, o ídolo com essa envergadura fez a tolice de rogar na mídia que o técnico Scolari o chamasse. A rigor, de repente, ver um artista desse porte sair do execrável estrelismo ao rebaixamento público dói. Sua trajetória profissional, por si, o desautorizaria a tomar essa atitude de pedir pela imprensa para ser convocado. Daí, mesmo com o Brasil tendo ganho o Mundial na Ásia, esse atacante foi o derrotado número um. E, sabendo disso, ele se transferiu em 2002 para o Fluminense, talvez querendo dizer que sobreviveria a tudo - até ao futebol medíocre do Catar, que o contratara por três meses a US$ 1,5 milhões, em 2003. Mas, no ano seguinte - quando, por ironia, foi dito que ele "era um ex-atleta em atuação" -, Romário voltou ao Fluminense pra jogar de vez em quando. Aí, de repente, volta ao Vasco para ser o maior goleador do Campeonato Brasileiro de 2005 e exigir privilégios. Até março de 2006, ele insiste em jogar aos 40 anos. E alega a necessidade de fazer o milésimo gol na carreira. Mas pode largar o Vasco ou tudo. Afinal, Romário sempre foi de repente.
PS.: Este texto de Antonio Falcão afalkao@hotmail.com integra o livro "Os Artistas do Futebol Brasileiro.
E o dia 20 de maio de 2007 entrou para a História. Romário, aos 40 anos fez o seu milésimo gol no seu palco de São Januário, com seu Vasco da Gama. Também de pênalti, como Pelé.
Fonte: http://www.contrapie.com
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